A oposição ajudou a mover Copenhague
De hoje até o próximo dia 18 os olhos do mundo estarão voltados para Copenhague, na Dinamarca. É lá que se realiza a COP-15, sigla que identifica a 15ª Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas. Em uma linha, o objetivo é evitar que a temperatura média no planeta não se eleve mais de dois graus Celsius até 2100 e encontrar maneiras de atingir esta meta.
O Brasil chega com uma proposta vistosa à conferência: promete reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em até 39% até 2020. A diminuição, porém, não será absoluta: o que o governo brasileiro propõe é agir para que o total de poluentes que se prevê gerar daqui a dez anos seja 39% menor do que seria se nada fosse feito.
A fixação de uma meta numérica pelo Brasil foi considerada importante para empurrar outros países a fazer o mesmo. Pode ser. Semanas depois, EUA, China e Índia, que relutavam muito, aceitaram também apresentar compromissos mais concretos. Mas o fato é que a oposição brasileira pode se orgulhar de ter contribuído para isso.
Não é exagero. Até o início de novembro, o governo Lula resistia a comprometer-se com um objetivo numérico. O discurso do presidente e da ministra Dilma Rousseff era uníssono: a responsabilidade por limpar o planeta é dos países desenvolvidos, que o sujaram para se tornar as potências econômicas que hoje são. Um blábláblá para não fazer nada, bem ao estilo de quem só levou o meio ambiente a sério quando ele se tornou uma ameaça eleitoral.
O governo federal decidiu fixar uma meta nacional apenas depois que o governo de São Paulo sancionou uma lei definindo que, no estado, as emissões terão de ser reduzidas em 20% até 2020. Com um detalhe: a meta paulista é absoluta. O estado comprometeu-se a emitir, daqui a dez anos, 20% menos do que emitia em 2005. E transformou isso em lei. Serão 24 milhões de toneladas de gases poluentes a menos na atmosfera por ano.
Estava correto o governador José Serra quando afirmou, na ocasião em que a lei paulista foi sancionada, em 9 de novembro: “Eu estou convencido de que se o nosso país assumir posições mais avançadas, é mais fácil mobilizar a opinião pública mundial para pressionar países desenvolvidos, como Estados Unidos, ou países não plenamente desenvolvidos, como a China, que são os principais adversários, hoje em dia, de uma posição mais ousada no mundo, em relação às mudanças climáticas. É mais fácil mobilizarmos se dermos o exemplo, do que o contrário. Por isso é que nós sustentamos que o Brasil deve apresentar propostas ousadas, se houver a convicção nesse sentido. Não deve ser por questões táticas que deixe de apresentá-las”. Dito e feito. Se Copenhague irá gerar os resultados que de lá se espera são outros quinhentos.
Estudo feito pela Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável indica que a meta brasileira deve significar, na prática, um corte menor do que as cifras polpudas que o governo Lula vem alardeando. Emissões 37% (ponto médio entre os percentuais que o Brasil apresentará) menores em 2020 representariam uma redução absoluta de 22% em relação às de 2005. É bom; só não é a coca-cola toda que o governo Lula quer fazer parecer.
A principal contribuição brasileira para combater o aquecimento global virá da floresta amazônica. A meta é cortar em 80% o desmatamento. No cerrado, que hoje gera tanto CO2 quanto a Amazônia, o objetivo é reduzir o avanço das motosserras em 40%. É um bom começo; o problema é o caminho e as escolhas que o país tem feito nos últimos anos.
Um exemplo vem da nossa matriz energética. O Brasil é privilegiado no mundo: de toda a energia que consumimos, 46% têm origem renovável. A média mundial é de 13%, e a dos países desenvolvidos, 7%. Isso significa que temos enorme superioridade nesta área e vários corpos de vantagem na corrida para salvar o planeta.
Ocorre que esta matriz vistosa e limpa está se tornando mais suja, a partir da opção preferencial do governo Lula pelo uso de combustíveis fósseis altamente poluentes para gerar energia. O Plano Decenal de Energia prevê aumento da geração térmica até 2017. As termelétricas a óleo combustível passarão a responder por 5,7% da eletricidade gerada, contra 1,3% atuais. As hidrelétricas cairiam de 87% para 71%.
“Em outras palavras, a tendência brasileira, no momento, é ‘carbonizar’ sua matriz exemplar”, escreveu Marcelo Leite na edição da Folha de S.Paulo de ontem. “Caminhamos, portanto, na contramão de países como Índia e China, que conseguem crescer diminuindo a intensidade carbônica (quantidade de carbono emitida por unidade de PIB)”.
Indicação de que as palavras oficiais não se refletem na realidade é que, enquanto o mundo todo pensa no pós-carbono, ou seja, em reduzir o uso deste componente poluente, o Brasil se atola nas discussões do pré-sal, sem que as propostas oficiais apresentadas para sua exploração prevejam, minimamente, como transformar o petróleo descoberto em propulsor do uso de fontes limpas.
Dilma Rousseff – que se notabilizou por relegar as questões ambientais a enésimo plano – chefiará a delegação brasileira em Copenhague. É a caricatura pronta e acabada das contraditórias opções que o país vem adotando nesta área nos últimos anos.
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